quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

A estranha relação humana


O que fazer quando a pessoa que trabalha atrás de você está grávida de oito meses e tem uma mãe com câncer na bexiga (pela segunda vez)? Você ouve tudo, todas as angústias, os choros, a falta de ar, o medo da morte de uma pessoa tão próxima (dela) e se sente de mãos atadas. Adianta dar literalmente o ombro pra que ela chore aliviada ? Adianta ler um salmo, fazer uma promessa, dizer que no fim tudo acaba bem? Daí depois você vê como o ser humano é injusto, pra não dizer burro.

Eu tava aqui, cheia de indagações, problematizando sobre a vida amorosa, me crucificando por ter ficado com um cara ontem, outro hoje e seu era uma vagal.
E quando volto os ouvidos para a mesa de trás vejo tantos outros questionamentos, mais importantes e relevantes que os meus. Foda-se o mercado imobiliário, foda-se a matéria que eu preciso escrever sobre o mercado condominial, dane-se que eu não almocei, ou preciso fazer uma faxina daquelas às 21h30 de uma quinta-feira.

Eu queria (muito) era ajudar essa mulher que, mãe de três filhos, faz voz firme com a própria mãe, e, ao desligar o telefone, cai em prantos sem ver uma luz no fim do túnel. Simplesmente não consigo mais voltar para o texto, para o gravador e o blábláblá chato do advogado que me deu a entrevista. É chocante - pra dizer o mínimo - a impotência que temos diante da morte e como esse assunto mexe com as pessoas. A vida sim é a coisa mais importante e frágil desse mundo doido que nos rodeia. Fiquei me sentindo mal por ter mania de ficar procurando pêlo em ovo. E quanta gente também não tem mania de caçar problema onde não tem?

É fato que a moça que está passando por esses problemas não é minha melhor amiga, nem parente e nem nada. Seria muito mais fácil eu colocar o fone de ouvido no volume máximo e colocar o Chico pra tocar. Não é a minha vida mesmo, né? Não. Não. Não. Não foi assim que eu me senti. Pelo contrário, um gosto amargo e um embrulhamento no estômago tomaram conta de mim, isso sim. Eu olhei pra trás umas três vezes e a ví encostada com os braços no teclado chorando aquele choro sentido com um barrigão balançando. A vontade era ir lá e dar um abraço bem forte nela, mesmo que isso não mudasse absolutamente nada. Mas aí, fiquei pensando se fosse comigo. Será que eu iria querer um ombro amigo de graça ou preferiria ficar quieta na minha?

Vieram outras indagações sobre as relações dos seres-humanos, minha cabeça passou pela lua, por Freud, pela sensibilidade das grávidas, e nesse vai-não-vai, eu não consegui levantar da cadeira. Cinco minutos depois ela atendeu o telefone com a mesma voz firme, falou com o doutor e já marcou a consulta da mãe para amanhã. A vontade de ajudar permaneceu em mim e fiquei pensando em como as pessoas são estranhas, mas que sem dúvida, essa mulher é uma guerreira e eu peço a Deus(?) pra que tudo se resolva na vida dela, mesmo acompanhando tudo de longe e aflitamente.

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