quarta-feira, 13 de maio de 2015

Sobre o melhor vinagrete do mundo

Nessa vida já fiz muita coisa, sempre com a intensidade que herdei de berço. Já cruzei São Paulo indo longe, muito longe, mais precisamente no Jardim 9 de Julho, São Mateus, zona leste. Do Butantã até lá eram 50 minutos de carro ou 1h30 de ônibus e metrô. E foi assim por uns três meses. Quando me envolvo, me envolvo mesmo, que esse negócio de regular sentimento nunca foi comigo.

Era uma cidade completamente diferente da que eu vivia, interessante e viva. Recheada de bailes funk, pessoas na rua ouvindo som alto, churrasco no quintal, bares. Descrevendo assim parece igual a todos os bairros, mas era diferente. As pessoas meio desconfiadas, porém acolhedoras. A gente ia entrando pelas casas da vizinhança, comia uma torta aqui, tomava uma cerveja acolá. Meio interior, meio vila. Fui recebida sempre com muita simplicidade, e curiosa, captava tudo ao meu redor: as casas, os cheiros, os costumes, o córrego sujo que cortava o bairro, a escola quase abandonada. Sesc Itaquera era nosso vizinho e meu pensamento: "Eu tô muito longe da minha casa, mas quer saber? Nem ligo, tô feliz e é isso que importa". E assim seguiu esse mini-romance até virar o outono e chegar ao final.

Admiro muito quem não teme demonstrar sentimentos, quem consegue abrir a vida e compartilhar seu modo de viver. Naquela época fui muito feliz com pouco, um quarto e uns CDS de forrós antigos, rememorando a época do KVA, comendo batata frita por aí, correndo atrás de uma vaga pra guardar meu carro, tomando café da manhã feito por quem eu gostava, tem melhor?

E todos os domingos em que eu estive lá, eu disse todos, eu comi o melhor vinagrete que já provei na minha vida. A mãe dele, fofa e forte, me contava histórias de como era ser negra e morar na periferia nos anos 80. Enquanto eu ouvia, ela cozinhava, cortava os tomates, as cebolas e as salsinhas. Eu, em silêncio, agradecia a cada colherada.

Num dia de verão e sol a pino, o bafo quente do chão invadia a casa e nem mesmo o solo, que geralmente é fresco, dava conta do calor. No fundo da casa havia um poço e foi de lá que tiramos os baldes da água gelada pra sossegar o corpo.

Atualmente, trabalhando no Belém, diariamente pego o mesmo metrô que há anos atrás me levava para lá. Apesar de rápida essa história foi bonita e verdadeira. São nesses momentos que tenho orgulho de tudo que ja vivi, de quem conheci sem medo do que vinha pela frente. Não tive mais notícias deles, mas o vinagrete jamais saiu da minha cabeça (e do meu paladar).


Núcleo Base.


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