Era uma cidade completamente diferente da que eu vivia, interessante e viva. Recheada de bailes funk, pessoas na rua ouvindo som alto, churrasco no quintal, bares. Descrevendo assim parece igual a todos os bairros, mas era diferente. As pessoas meio desconfiadas, porém acolhedoras. A gente ia entrando pelas casas da vizinhança, comia uma torta aqui, tomava uma cerveja acolá. Meio interior, meio vila. Fui recebida sempre com muita simplicidade, e curiosa, captava tudo ao meu redor: as casas, os cheiros, os costumes, o córrego sujo que cortava o bairro, a escola quase abandonada. Sesc Itaquera era nosso vizinho e meu pensamento: "Eu tô muito longe da minha casa, mas quer saber? Nem ligo, tô feliz e é isso que importa". E assim seguiu esse mini-romance até virar o outono e chegar ao final.
Admiro muito quem não teme demonstrar sentimentos, quem consegue abrir a vida e compartilhar seu modo de viver. Naquela época fui muito feliz com pouco, um quarto e uns CDS de forrós antigos, rememorando a época do KVA, comendo batata frita por aí, correndo atrás de uma vaga pra guardar meu carro, tomando café da manhã feito por quem eu gostava, tem melhor?
E todos os domingos em que eu estive lá, eu disse todos, eu comi o melhor vinagrete que já provei na minha vida. A mãe dele, fofa e forte, me contava histórias de como era ser negra e morar na periferia nos anos 80. Enquanto eu ouvia, ela cozinhava, cortava os tomates, as cebolas e as salsinhas. Eu, em silêncio, agradecia a cada colherada.
Num dia de verão e sol a pino, o bafo quente do chão invadia a casa e nem mesmo o solo, que geralmente é fresco, dava conta do calor. No fundo da casa havia um poço e foi de lá que tiramos os baldes da água gelada pra sossegar o corpo.
Atualmente, trabalhando no Belém, diariamente pego o mesmo metrô que há anos atrás me levava para lá. Apesar de rápida essa história foi bonita e verdadeira. São nesses momentos que tenho orgulho de tudo que ja vivi, de quem conheci sem medo do que vinha pela frente. Não tive mais notícias deles, mas o vinagrete jamais saiu da minha cabeça (e do meu paladar).
Núcleo Base.
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