Deveriam ter perguntado na primeira aula de jornalismo se os alunos estavam preparados para empunhar suas credenciais, conseguir a primeira fila de alguns eventos e umas entrevistas bem sensacionais, mas se pra isso eles também tinham gana para enfrentar estrelismo de alguns, regras capitalistas de todas as empresas (ou seja, rabo preso com algumas fontes), paciência para ver seu texto, vídeo, áudio sendo editado, esquartejado, alterado sem um pingo de dó e nem sempre poder retrucar.
Os professores deveriam dizer que eles vão trabalhar muito, muito mais que alguns, ganhar nem tanto assim, viver na dependência de especialistas que não tem tempo de falar ao telefone ou responder email, muito menos gravar um conteúdo. Deveriam ter avisado que os plantões não são brincadeira! Enquanto seus amigos vão viajar pra praia, campo ou camping, ele enfrentará a redação e vai ter de tirar leite de pedra pra produzir algo que valha pelo menos alguma audiência.
E precisa falar bem, escrever bem, ouvir bem, entender bem dos diversos assuntos que estarão em sua responsabilidade para chegar de maneira clara e interessante pra uma porrada de gente faminta por informação.
Na primeira aula, além do que é lead, notícia, nota e matéria especial, também deveriam ter dito, assim como quem não quer nada, que os veículos ou departamentos de comunicação e marketing nem sempre possuem recursos que viabilizem os trabalhos. E adiantar que ele terá que pegar quantas conduções for necessário, chegar antes do evento e entrevistado, estar impecável independente do trânsito, calor ou chuva que tiver pegado pelo meio do caminho e não terá hora certa para ir embora. E dependendo da urgência da matéria, o celular vai servir de câmera fotográfica ou de vídeo, o bloco de notas vai ajudar quando o entrevistado falar rápido demais, e quem diria, o gravador do mp3, aquele que ele comprou dos chineses na Av. Paulista, vira braço direito e não sai mais da bolsa/mochila. Não dá tempo de esperar por um equipamento bacaninha.
Ah! Importante lembrar que algumas fontes moram ou trabalham longe das redações. Tem gente que trampa em ou mora em Osasco, Guarulhos, Santo André, Grajaú, Granja Julieta,Parada Inglesa, Jaguaré, Penha, Aricanduva, Alphaville e todos esses lugares compõem a mesma São Paulo, nem sempre o email ou telefone são suficientes, e sem choro nem vela, ele terá que ir até lá, sem reclamar!
Deveriam ter dito também que muitas vezes ele pode ter conteúdo e ser esforçado pra caralho, mas aquela patricinha linda e gostosinha é sobrinha de algum diretor ou cacique da redação, e por isso meu caro, ela tá lá e ele não. Ou que ele pode fazer o processo seletivo junto com aquele mala da classe que não consegue escrever uma nota sequer. Mas no final das contas o processo seletivo é apenas um processo, e o mala tem muitos contatos e é carismático, por isso é ele quem assina aquela matéria esportiva. Essa é a vida, esse é o Brasil.
Vale dizer que dead line não é lenda e estar informado não é garantia de matéria pronta. De que adianta nego ler Carta Capital, Bravo!, Folha, assinar a Piauí, Época São Paulo, assistir a Globo News e ouvir a CBN se na hora H, nego trava. Não há tempo para pesquisas profundas e momentos de inspiração. Senta a bunda na cadeira e começa logo a produzir o que você precisa entregar.
Soa como pessimismo? Desculpa, a vida real é essa. Aquela cena em que você anda pelas ruas congestionadas em Nova York ou numa cidade grande se equilibrando num salto e com um gravador na mão só acontece nos filmes ou novelas da Rede Globo, ok? Vamos combinar que esse glamour que envolve o cargo de jornalista é balela? Falaremos de um fato real que o salário de um foca é cerca de R$ 2000,00? (chutando alto) Dá pra bancar as contas sem a ajuda do papai? É isso que você quer pro resto da tua vida?
Se os professores dissessem e questionassem tudo isso logo de cara o pensamento ia ser outro. A profissão é boa, mas requer trabalho (como todas as outras, obviamente). Agora se você quer estudar jornalismo simplesmente porque te agrada, ok, mas ser jornalista pra encher a boca na rodinha do bar ou almoço de família não enche a barriga de ninguém.
Não sei se quero mais jogar nesse time
Eu quero mais é ser feliz.
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