segunda-feira, 27 de abril de 2009
Memórias de Dolores
Dolores é carioca, mas se tornou paulistana de coração. Sua família se instalou na zona-oeste da cidade quando ela tinha apenas 9 anos. Esse texto é todinho dela. Então imagine uma voz firme, com sotaque do povo do Rio. Mandona e malandra, Lola não perdeu as características de quem naisce na cidade maravilhosa. E nem me deixou interferir no que teve vontade de escrever.
"Houve um dia em que quis tomar banho de chuva e partiu em direção há um lugar muito estimado. De tardezinha, do jeitinho que o desejo queria, enfim, uma garoa fina caiu sobre a cabeça. Sozinha para espairecer. Tomar vento na cara, na ânsia, na vontade de sentir completamente tudo de maneira única. Do lugar que estava pode avistar a cidade, os ângulos que marcaram épocas e reler cartas antigas, amassadas no bolso da calça. Lembrou-se dos cheiros e músicas que embalaram parte do seu passado. E se fizesse o movimento de vai-e-vem com a cabeça, conseguiria ver a vida quase que inteira porque por um só bairro viveu após chegar do outro Estado.
Melhores momentos, porres, choros de lavarem corpo a baixo, e muita, muita gente junta. Com a calça boca de sino e uma camisa florida e listrada, estava. Cabelo encaracolado torcido e preso com um palito de madeira. Largo sorriso com dentes meio amarelados, fruto de muito cigarro, coca-cola e café. MPB dominava o coração e a vitrola do quarto. É estranho assistir atualmente documentários e programas da época em que foi protagonista. Ela viveu tudo à flor da pele, como sempre acontece com a juventude. Os anos não voltam mais, mas teve certeza de que nada foi em vão. Recordou-se do quanto subia e descia as ruas, os mercadinhos, feiras-livres, sem nem pensar em usar outro tipo de locomoção que não fosse as próprias pernas. Era a São Paulo setentinha.
Bares, postes, janelas, céu. Cerveja de garrafa, tudo no jeito. Como era bom perambular pela Cidade Universitária e discutir política na USP. Ter memória é realmente maravilhoso! Aquela década certamente foi linda. Do alto da praça conseguiu avistar o prédio da Abril, a Marginal, os carros, luzes da cidade. Sozinha, nem a sombra como companheira poderia fazer parte desta nostalgia. Só ela, e ainda assim, era cansativo, árduo, pois não sabia quantas partes do eu tentavam se manifestar. Por mais que o local estivesse com outras pessoas, qualquer ato, ou puxada de conversa seria ignorado. Há dias em que é preciso colocar os pensamentos no lugar, se é que isso é possível. Tinha a necessidade do isolamento, pausar a correria desvairada.
Estranho. A única certeza era a de que seguia a diante, 50,54,56 anos passados. E se perdia nas lembranças que lhe davam orgulho e ao mesmo tempo a sensação de fracasso, porque apesar dos anos de ouro, nada que foi feito teve muita relevância. O Brasil democracia não é tão diferente daquele dos tempos de Ditadura. Mudaram-se os mandantes. Mascararam-se os problemas, mas a liberdade e o tal desenvolvimento ainda não chegaram. E não havia vontade de se mexer. Tique nas pernas cruzadas, mato nas mãos, olhos marejados e vento forte corando bochechas brancas. Agora prendia os olhos no céu, que nem estrelado, nem acinzentado estava. E a mania de cantar, não ligar para o que os outros dizem permanecia. Nem pensar na vida urbana ou em seus afazeres queria.
Apenas recordações. Do apartamento pequeno, paredes exprimidas, guarda-roupas embutidos, corredores e a parede creme. Pilhas de roupa, janela suja e foi feliz assim. Como numa transmissão de pensamento, a chuva voltou a cair. Abriu a boca pra sentir o gosto da água paulistana. E a garota, mulher, senhora sem muita afeição, continuou assim assim naquela sexta-feira à noite, Madalena que ela leva no coração. Recordações apenas."
sexta-feira, 24 de abril de 2009
Pqna Dosagem...
... Sobre felicidade:
Andava atrás de uma música do Gonzagão. Ouvi uma vez no forró, mas consegui gravar apenas umas palavrinhas de nada. E dale Vagalume a dentro, e joga no Google e nadica. Ai que angústia querer ouvir e não poder. Pois bem. Tô fuçando num blog de música e eis que ela surgiu piscante bem na minha frente! Consegui passar pro meu Ipodo vindo diretamente da China e passarei o final de semana ouvindo sem parar! A vida às vezes é muito boa e eu sou feliz por nada.
Obrigada Brasil!
segunda-feira, 20 de abril de 2009
Feliz é pouco
Esse aqui vai pro meu pai, com toda a empolgação e um belo gole de cerveja que dou após ver a semi-final do campeonato Paulista de 2009.
E eu que já pensei em seguir o rumo do jornalismo esportivo não via mais graça em futebol. É sempre a mesma coisa, as mesmas tabelas, campeonatos, troca-troca de jogadores e zás zás zás. Quase não tem homem bonito em campo, e o Kaká, por quem já fui fã, anda metido demais pro gosto. Mas depois de ontem, me senti na obrigação de escrever um texto sobre o assunto. Sou corintiana com uma ligeira queda pelo seu arqui-rival, se é que isso é possível. Assisti ao jogo na sala de minha casa, sozinha. Minha mãe nunca dá sorte pro timão. Como boa pessimista, achei que o Corinthians não conseguiria bater o São Paulo, mas graças a Deus estava enganada. E pra completar o cenário futebolístico, no meu prédio a maioria da pivetada é bambi. E eu com grito contido na garganta.
Depois de quase comer os dedos com um primeiro tempo angustiado, posso dizer que estou de alma lavada. Lavada e bem cheirosa pra ser honesta. Vencer o São Paulo no Morumbi lotado, ver o gorduchão fazer gol, e saber que Rogério Ceni precisa do auxilio de muletas pra andar não tem preço. Além disso, ainda pude olhar o Mano, que apesar do nome de maloquinha, deixa Muricy Ramalho no chão se tratando de roupas, forma física e cor dos olhos (muito importante). São Paulino é bicho chato. Falam da Libertadores, falam do seu estádio, do dinheiro, e se gabavam por ter um goleiro imbatível e metido. Mas depois de quarta, cadê o entusiasmo pessoal? Só sei que dei uns gritos na janela e a pirralhada me olhou com cara de tristeza. Fazia tempo que não torcia desse jeito.
Mesmo se o Corinthians não ganhar o campeonato, já valeu por ter tirado os malas da competição. Ainda bem que desisti de jornal esportivo. Acho que não saberia distanciar o trabalho do meu time do coração. E convenhamos que ninguém merece ficar ouvindo o Chico Lang e suas baboseiras. Espero que no próximo domingo o time de Mano possa mostrar a que veio. Não preciso ser imparcial aqui. Gosto do Santos, mas esse negócio de que vença o melhor não é comigo. Boto fé no meu timão. Güenta coração pai!
É nozes!
quinta-feira, 16 de abril de 2009
Pqna Dosagem...
..Sobre mães:
Minha mãe é assim: se como demais ela diz que vou ficar gorda, não vou arranjar namorado, que chocolate e fritura faz mal etc. Daí que comecei uma dietinha simpática e deixei de comer algumas coisas. No domingo de Páscoa:
Mãe: "Você não vai comer mais batatas? E o bolo? fiz o bolo pra você!
Eu: "Manhê, ja falei que tô maneirando na comida!"
Mãe: "Desse jeito você vai ficar muito seca, feia. Assim não dá graça de cozinhar nessa casa!
Tem coisas que não dá pra entender...
Bom-humor não é bobeira
Algumas pessoas têm o dom de confundir bom-humor com bobeira. Vejo aos montes situações em que há sempre um bobão infortunando alguém, achando que está agradando muito, e a outra pessoa, pra não passar por mal-educada, dá aquele sorriso manso de quem não quer comprar briga. Na empresa e na família sempre tem um assim.
Seja aquele primo besta que não sabe fazer piada e tira um sarro dos quilos extras de outrem, ou o mala da repartição que mete o dedo no seu monitor e solta uma frase do tipo: “Heheh faltava fazer isso com você! Mas não fica brava, hein!” ¬¬
E é isso que vem acontecendo comigo há um certo tempo. Eu adoro o lugar em que eu trabalho. Gosto do que faço, as pessoas são legais e não tem motivo pra chegar de cara fechada. Procuro não me atrasar, dizer um “oie” pra todos e seguir pra minha mesa. Mas é assim que acontece. Você é simpática e os outros acham que são seus melhores amigos. Confundem educação com intimidade.
Aí, naquele dia em que você não tá com vontade de conversar, vem um e te cutuca achando que você vai rir. Ou outro arrisca uma piada e diz que isso é falta de ... e faz um gesto com a mão. Geralmente isso é feito por um homem. E os outros bobões acham uma graça que não consigo entender. Precisa ter muita paciência pra não soltar um "porque você não vai tomar no cú seu troxa?" e acabar perdendo o emprego.
Dia desses alguém disse: “Tá de mau-humor Nathy?” no que eu mandei um: “Tô sim”. A pessoa ficou sem graça porque estava crente que eu não seria tão sincera. Depois senti certo incomodo por ter respondido daquela maneira, mas convenhamos que se eu não dissesse nada a situação só iria piorar. Não entendo como não passa pela cabeça dessas pessoas que nem todo mundo adora brincadeiras, nem todo mundo acorda sempre com o pé direito, nem todo mundo tem vontade de rir de coisas que simplesmente não têm graça. Daí se eu decido gritar isso aos quatro cantos do mundo, sou taxada de velha, ranzinza, rabugenta e vários outros adjetivos do gênero.
Ser engraçado é completamente diferente de ser bobo. Meu reino por uma tirada inteligente feita por alguém de voz séria. Dou risada feito criança. Agora, quem acha que vai me fazer gargalhar porque me passou uma rasteira, escondeu minha cadeira, falou que meu cabelo tem chapinha, ou estou comendo demais etcetc, pode esperar sentado. É por essas e outras que continuo amando o meu mestre (que Deus o tenha) Saraiva, tolerância zero!
sexta-feira, 3 de abril de 2009
A arte do desapego
É difícil se desfazer de coisas velhas. Ainda mais quando tendemos ao saudosismo, romantismo e sentimentalismo barato. Seja uma caixa de revista guardada há tanto tempo debaixo da cama, uma sapatilha desbotada nunca usada, conhecidos com quem mantemos contato por pura educação, uma casa caindo aos pedaços, mas que já te trouxe paz por vários anos. É uma faca de dois gumes.
A gente sempre sabe quando está na hora de lotar nosso lixo pessoal, e nem sempre vemos de que maneira fazer isso. As revistas, ainda que velhas, ainda trazem informações. Voltamos ao tempo em que ela era atual. Vemos as modas da época, os hits que bombavam na rádio, o amor dos velhos tempos, as gírias. Por que jogar fora se foi tudo tão bem vivido? É como se as revistas fossem embora junto com uma parte da sua vida. Daí você olha em volta e percebe que o quarto anda lotado demais pra guardá-las por mais tempo.
O mesmo acontece com um grupo de amigos o qual nos distanciamos por motivos de força maior. Cada um seguiu um rumo, sem brigas, mas já não é a mesma coisa. E aí a gente os vê online todos os dias e as conversas não surgem. Acompanhamos suas vidas pelo Orkut, e é aquela sensação estranha que não sei explicar. Mas até o fato de receber um scrap incomoda. A solução pro problema é simples: exclusão de ambas as listas. Pra quê manter contato com quem não te acrescenta em nada? Aí bate o sentimentalismo, você fica na corda bamba, talvez não seja pra tanto, afinal vivemos bons momentos e blábláblá... e acaba deixando tudo como está.
Apego é coisa séria. E às vezes empata a vida. Sou tão apegada às minhas coisas que tenho medo de jogar papéis antigos fora, guardo bilhetes, cartinhas, agendas, roupas, ursinhos, chinelos, toalhinhas, lápis de cor, Nintendinho, dicionário Aurélio, até de escova de dente é difícil me separar. E pra completar, guardo datas, mesmo as tristes. Tô dizendo que apego é coisa séria.
O importante é ver que existe a luz do fim do túnel. Nesse caso, chega o momento de nos desfazer dessas quinquilharias. Fácil não é, mas age tipo Novalgina. Amarga no começo e depois faz passar a dor. Apego também machuca. E aí a gente começa a se sentir mais leve (apesar do clichê, é verdade!), vai trombando com coisas novas, e percebendo que no fim, o medo de abandonar o velho era pura insegurança. Tentemos à nostalgia, mas exercitar o desapego e aceitar o novo também é uma forma de crescimento.
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