domingo, 23 de dezembro de 2012

A Chave

O dia começou estranho. Acordei num lugar achando que estava noutro. Segui pra casa ansiosa por deitar logo na minha cama, garoava anunciando um sábado esquisito. Chego, tento abrir a porta e me dou conta de que estou sem a chave, e o apê trancado. Uma só voltava na segunda, outra sem data certa.

 Volto pro carro imaginando uma alternativa, eu e meus planos mirabolantes. Sigo para a casa da velha eterna na esperança de talvez conseguir deitar e lograr êxito. Ele como sempre muito exibido e bem intecionado diz que vai fazer numa viagem só o resgaste da bendita chave e de quebra já faz a feira.

Continuo no quarto pensando como uma simples chave pode fazer com que planos sejam totalmente alterados. A velha chata como sempre só reclama, levanta da cama resmugando jogando a culpa em mim.
O preguiçoso pega a chave do meu carro e ruma para o hospital na seção de tratamento de sua primogênita.

No relógio 12h00. O poderoso e bem intensionado havia esquecido que a responsabilidade de levar a velha no hospital era sua. Pega enfim a chave e para para fazer uma feira que na minha cabeça é eterna. Espero a chegada do pastel. Começo uma conversa e aproximação com quem logo dividirei os dias. Gosto da experiência, mas gosto mais de mim. Nada do pastel, nada da porra da feira, muito menos da chave. Garoa. Eu com a roupa da balada de ontem, resquícios de lápis e rímel, descalça, barriga roncando, cabeça doendo, coração bombando. Falta muito pra acabar logo esse rolo? Penso.

Ele finalmente chega, rindo de não sei o quê, brindando o cotidiano, como é de costume.
Como um pastel de carne e sigo tomando infinitas dose de café. No relógio agora já são 13h30. O que era pra ser apenas o resgate duma maldita chave, passa a ser o centro do meu sábado. Espero, aguardo, converso aqui, acolá. Ensaio próximos planos do restante do dia de folga. Na verdade, vontades não existem. Queria dormir muito, arrancar o cérebro da cabeça e o por para recarregar, como se fosse um celular. Seria infinitamente mais fácil. Sou cobrada pelos outros por momentos de felicidade, não entendem que nem sepre dá pra sorrir e fazer sorrir. 14h00 e nada do meu carro. Agora tenho só a chave.

Tento me concentrar num livro ou revista do mês passado. Nada.
Penso em retormar a conversinha infundada. Nada.
Insisto em olhar chacrinha na tevê, desisto.

Cobro-me pela imensa tolice de não juntar todas as chaves num único chaveiro. Meu lado Poliana me acalma dizendo que por mais tolo que seja, perder o chaveiro com todas as chaves importantes é mais burro do que deixar em casa como fiz.

Meu carro. Cadê? Na ânsia de resolver logo o problema entreguei a chave do carro. Agora penso no quão precipitada fui. Não sei como dirige, como estaciona, carro é íntimo demais, saca?

Ensaio tomar um ar na velha varanda. Olho ao redor: casas antigas, céu cinza, varal, mesa, vaso de flor. Desde que me conheço por gente aquele vaso tá ali no mesmo lugar do mesmo jeito. Algumas coisas realmente não mudam. Bate vento, bate garoa e decido tomar banho. Mas banho, assim como cama, sofá e televisão têm gosto diferente quando feitos em outros cômodos que não sejam sua casa. Sinto-me melhor, suspiro. No relógio 14h43. Caralhos! Foram pro inferno e esqueceram de me avisar?

Novamente penso que nunca mais nessa vida vou andar sem minha chave. Se for pruma rave enfio a chave no pé, odeio levar bolsa em certas ocasiões, mas correr o risco de viver dias esquisitos como esse, jamais. Poderia reduzir o fato e ir curtir o dia, mas era justamente minha cama naquele apartamento bagunçado que eu gostaria de estar. Não gosto quando o destino decide mudar planos que já estavam na cabeça e no coração.

Uma simples chave. Uma idiota e pobre chave. E eu aqui, de regata, shorts e raider emprestados.

Ansiosa, no relógio agora já são 15h00. Perdi metade do meu dia nessa palhaçada e a única e exclusiva culpada por tudo isso sou eu. Merda!

Sento novamente pra tomar vento quando avisto meu carro chegar. Aleluia! Pego a bolsa, a chave da outra, a chave do carro, a chave do outro,  revisto todos esses itens umas cinco vezes antes de finalmente partir.  Tudo ok, bora pro apê, sem dar tchau e nem olhar a velha.

Chego no apartamento, sinto uma sensação plena de estar onde quero, e penso que agora vou fingir que são 10h da manhã e retomar todos meus planos na esperança de esquecer todo esse pequeno e intenso rolo ocasionado por uma simples chave.

Mas antes! Pego a minha chave e junto com a do carro.


O significado de chave agora é outro. Abre portas, liga carros, e pode mudar rumos. Brincar com chaves? Jamais...











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